terça-feira, 20 de outubro de 2015

O Barato Orgânico

A feirinha orgânica onde ocasionalmente compro frutas e verduras possui uma atmosfera agradável, meio zen e meio coisa de comércio mesmo. Para uns, aquilo é um prolongamento de um estilo saudável de vida que acreditam, mas, para outros, é apenas um meio de sustento. Seus frequentadores são pessoas afáveis de fala mansa, pele bonita proporcionada pelo hábito de comer alimentos saudáveis e estilo de se vestir que não segue nenhuma tendência de moda ou grife famosa, a não ser o prazer de se vestir do jeito que se sente bem.

A feira tem início aos primeiros raios de sol e cococoricar de galos e vai até o meio da manhã, quando a xepa, um tomate amassado ou alface murcha, é disputada por fregueses desejosos de um bônus extra que lhe proporcionará o prolongamento da vida por só consumirem alimentos saudáveis e por também acreditarem realmente que podem sucumbir ao ingerirem comidas feitas com ingredientes produzidos pela agroindústria. Eu, que me considero um eclético na hora de comer, não tenho ambições de morrer saudável ou de viver mais que o prazo de validade que o meu corpo poder me oferecer sem sacrifícios.

A meia dúzia de feirantes que trabalha ali recorda de mim, apesar deu não ser um freguês frequente e eu lembro de seus rostos, mas não recordo de seus nomes com a mesma facilidade com que sei o do senhor Cláudio, o rapaz que varre a minha rua. No entanto, naquele dia, havia uma feirante novata e que destoava do grupo. Ela era bem mais jovem e franzina, possuía o olhar inocente de uma garotinha. Não tinha pinta de produtora agrícola.

Aproximei-me de sua banca e vi que em lugar de frutas ou legumes, ela expunha pequenos frascos de plásticos de tamanhos variados com rótulos estrangeiros. Esta pequena ruptura do padrão da feirinha acontece com frequência e, por isso, há semanas que está lá um vendedor de sabonetes orgânicos ou de utensílios de cozinha feitos de bambu, este igualmente feito de material orgânico.

— Para quê serve isto? – perguntei examinado um dos frascos já na minha mão.

— Este é um adubo líquido orgânico importado da Holanda.

— Ah! – respondi.

Coloquei o frasco de volta e peguei outro com a mesma curiosidade.

— Este é um fertilizante. – ela disse com a agilidade de uma vendedora solícita e experiente.

Examinei um cubinho que parecia feito de lã e nem precisei perguntar o que era.

— Isso serve para fixar as raízes de uma muda. – ela explicou de forma didática.

— Hum.

Mas é só isto, pensei olhando ao redor. Ela não planta nem uma salsinha ou manjericão utilizando estas maravilhas importadas para demonstrar a sua eficácia?

— E você, o que cultiva? – perguntei. Ela mais parecia uma estudante universitária fazendo um bico.

— Eu planto maconha. – respondeu à queima roupa.

E com a mesma naturalidade com que ela me respondeu, perguntei:

— E você tem aí o fruto de seu cultivo para a venda?

— Não, a sua venda é ilegal e ainda não foi liberada. – disse com um sorriso otimista. Talvez ela só aguardasse o comércio da erva ser liberado num futuro bem próximo para poder desovar as suas safras estocadas.

— Não tem nem aí nem uma amostra grátis, não? – insisti malicioso.

— Infelizmente, só planto para o meu consumo. – ela sorriu mais uma vez.

Seguiu-se um silêncio de minha parte por falta do que dizer e ela mantinha-se olhando para mim aguardando até que me veio uma inspiração.

— Hum... E o seu produto é de qualidade?

— ô, de excelente qualidade! – ela respondeu orgulhosa.


Rio Vermelho, 19 de outubro de 2015.