A feirinha orgânica onde
ocasionalmente compro frutas e verduras possui uma atmosfera agradável, meio
zen e meio coisa de comércio mesmo. Para uns, aquilo é um prolongamento de um estilo
saudável de vida que acreditam, mas, para outros, é apenas um meio de sustento.
Seus frequentadores são pessoas afáveis de fala mansa, pele bonita proporcionada
pelo hábito de comer alimentos saudáveis e estilo de se vestir que não segue nenhuma
tendência de moda ou grife famosa, a não ser o prazer de se vestir do jeito que
se sente bem.
A feira tem início aos
primeiros raios de sol e cococoricar de galos e vai até o meio da manhã, quando
a xepa, um tomate amassado ou alface murcha, é disputada por fregueses desejosos
de um bônus extra que lhe proporcionará o prolongamento da vida por só consumirem
alimentos saudáveis e por também acreditarem realmente que podem sucumbir ao
ingerirem comidas feitas com ingredientes produzidos pela agroindústria. Eu,
que me considero um eclético na hora de comer, não tenho ambições de morrer saudável
ou de viver mais que o prazo de validade que o meu corpo poder me oferecer sem
sacrifícios.
A meia dúzia de feirantes que
trabalha ali recorda de mim, apesar deu não ser um freguês frequente e eu lembro
de seus rostos, mas não recordo de seus nomes com a mesma facilidade com que
sei o do senhor Cláudio, o rapaz que varre a minha rua. No entanto, naquele
dia, havia uma feirante novata e que destoava do grupo. Ela era bem mais jovem
e franzina, possuía o olhar inocente de uma garotinha. Não tinha pinta de produtora
agrícola.
Aproximei-me de sua banca e vi
que em lugar de frutas ou legumes, ela expunha pequenos frascos de plásticos de
tamanhos variados com rótulos estrangeiros. Esta pequena ruptura do padrão da
feirinha acontece com frequência e, por isso, há semanas que está lá um
vendedor de sabonetes orgânicos ou de utensílios de cozinha feitos de bambu,
este igualmente feito de material orgânico.
— Para quê serve isto? – perguntei
examinado um dos frascos já na minha mão.
— Este é um adubo líquido orgânico
importado da Holanda.
— Ah! – respondi.
Coloquei o frasco de volta e
peguei outro com a mesma curiosidade.
— Este é um fertilizante. – ela
disse com a agilidade de uma vendedora solícita e experiente.
Examinei um cubinho que parecia
feito de lã e nem precisei perguntar o que era.
— Isso serve para fixar as
raízes de uma muda. – ela explicou de forma didática.
— Hum.
Mas é só isto, pensei olhando
ao redor. Ela não planta nem uma salsinha ou manjericão utilizando estas
maravilhas importadas para demonstrar a sua eficácia?
— E você, o que cultiva? – perguntei.
Ela mais parecia uma estudante universitária fazendo um bico.
— Eu planto maconha. –
respondeu à queima roupa.
E com a mesma naturalidade com
que ela me respondeu, perguntei:
— E você tem aí o fruto de seu
cultivo para a venda?
— Não, a sua venda é ilegal e ainda
não foi liberada. – disse com um sorriso otimista. Talvez ela só aguardasse o
comércio da erva ser liberado num futuro bem próximo para poder desovar as suas
safras estocadas.
— Não tem nem aí nem uma
amostra grátis, não? – insisti malicioso.
— Infelizmente, só planto para
o meu consumo. – ela sorriu mais uma vez.
Seguiu-se um silêncio de minha
parte por falta do que dizer e ela mantinha-se olhando para mim aguardando até
que me veio uma inspiração.
— Hum... E o seu produto é de
qualidade?
— ô, de excelente qualidade! –
ela respondeu orgulhosa.
Rio Vermelho, 19 de
outubro de 2015.