A timidez e a insegurança que sempre afligiram J.R. mantinha-o distante das mulheres, razão pela qual ele era um homem triste e solitário. Ao se interessar por uma jovem, em busca do amor, a agradável sensação de gostar de alguém logo se transformava em frustração e amargura, pois lhe faltava coragem suficiente para aproximar-se da moça para cortejá-la com gentis palavras. Esta sua completa falta de habilidade para conquistar o sexo oposto, roubava-lhe a oportunidade de, pelo menos uma vez na vida, experimentar esta coisa de que tanto falam, que é amor.
Certo final de tarde de um bonito dia de verão, no caminho andando de todo dia para a padaria, J.R. passou em frente à agência de passagens do bairro e constatou encantado, ao olhar para o interior da loja através da vitrine, que trabalhava lá uma nova funcionária. Uma bela moça de formas curvilíneas no tronco e nos peitos, cuja pele era alva e os cabelos louros, destes que se vendem nas farmácias, em pó dentro de caixas. Vestia-se com roupas apertadas provocantes e era enfeitada com brincos e pulseiras cintilantes que alegremente lembravam uma árvore natalina fora da estação. Seu olhar era confiante e pelo jeito com mexia a boca sem parar, ele teve a impressão de que ela apreciava muito falar, embora de onde ele a contemplasse, lhe era impossível ouvir a sua voz, que ele a imaginava ser tão bela quanto a sua dona. J.R. logo se sentiu atraído por aquela jovem, pois, apesar de sua timidez e falta de autoconfiança, ele tinha uma tremenda queda por mulheres bonitas e parecia só se interessar por estas. Quem sabe se as suas pretensões fossem mais modestas, ele conseguisse conquistar o coração de uma jovem pobre de atributos físicos, uma vez que ele próprio não era nenhum príncipe.
Desde aquela memorável tarde, J.R. fazia questão de ele próprio ir comprar o pão de sua casa, além das outras vezes que inventava desculpa para passar em frente à loja de passagens só para ter a chance de admirar a bela moça. Às vezes ele parava em frente à vitrine fingindo estar lendo um cartaz de propaganda de pacotes de viagem, quando, na verdade, seus olhos não desviavam da jovem que ele comia com os olhos apaixonados. Não demorou muito, no entanto, ela percebeu que tinha um admirador que ficava lhe espiando com um olhar de peixe morto ou coisa parecida. No entanto, o acanhamento de J.R. era tal que ele nem mesmo jogava-lhe um sorriso ou aceno para marcar presença.
De início, a moça não lhe deu importância, afinal estava acostumada ao assédio masculino que, por sinal, lhe inchava de vaidade, mas como J.R. não ousava entrar na loja com desculpa alguma para lhe falar, aquele seu jeito insistente de ficar apenas olhando para ela começou a lhe dar nos nervos. Passou a irritar-se ao vê-lo do outro lado da vitrine, espionando-a sem dizer ou fazer coisa alguma. Até então, ela fingia não perceber nada, ignorava os seus olhares. Mas um dia perdeu a paciência e o encarou fazendo uma careta de dar medo e esbravejou ensandecida, mesmo sabendo que ele, do lado de fora da loja, jamais a escutaria. No entanto, aquele gesto hostil foi o suficiente para afugentar o medroso J.R., que resolveu não mais dirigir-lhe o olhar, tanto por receio, como por ter se dado conta de seu inconveniente comportamento.
J.R., no entanto, manteve a sua rotina diária de ir comprar o pão no final da tarde, mas não mais olhou em direção à loja de passagens e evitava passar em frente. No entanto, aquele seu sumiço não foi ignorado pela moça. Vez por outra ela desviava sua atenção do serviço para dar uma espiada para o lado de fora da vitrine sem, no entanto, encontrar mais os olhares do pobre J.R. Aquele súbito desaparecimento de seu admirador taciturno causou-lhe melancolia, pois, embora ela se incomodasse com o olhar de peixe morto do rapaz, passou a sentir falta daquela intromissão à sua privacidade, e procurava por seus olhos com ansiedade. Ela não conseguia mais se concentrar no trabalho porque ficava toda hora de olho no lado de fora da loja. Impaciente, ia até a porta da agência e olhava para os lados com a angústia de quem esperava o carteiro que demorava trazendo uma importante encomenda. Ela até tomou o cuidado de ir para o trabalho com roupas mais curtas e provocantes, caprichou no visual, mas nada disso serviu para atrair de volta o J.R. Que fim teria tido ele?
Para a sua surpresa, certo dia, J.R. reapareceu. Passou apressado em frente da agência em direção à padaria. Ao vê-lo, foi assaltada de alegria e excitamento. E como ela já percebera que daquele mato não saía coelho, resolveu que já era hora de ela mesma fazer alguma coisa a respeito. Foi até a padaria encontrá-lo para tirar satisfações sobre o seu sumiço, e usando as artimanhas que são próprias do gênero feminino, provocou um encontro com ele na fila do caixa.
— Você sumiu de lá da loja, não foi? Desistiu de viajar, foi? – perguntou com um sorriso matreiro.
J.R. surpreendeu-se com a voz em suas costas e olhou para trás para confirmar se era com ele que falavam.
— Hã? – foi a melhor resposta que conseguiu articular, surpreendido ao ver a moça que tanto cobiçou com os olhos.
— Nós estamos com uma promoção quase de graça para o Resort da Praia do Forte, tudo incluído. É pra casal.
— É? – enrubesceu.
A moça percebeu a timidez do rapaz. Homem tímido lhe deixava louca de assanhada, que ela gostava de acabar com aquele acanhamento, de corromper o pobre tímido em safado.
— Pois passe lá na loja mais tarde, viu. Venha tomar um cafezinho comigo. Senti a sua falta esses dias, viu. Olha, eu estou louca pra ir à Paria do Forte nesse pacote, mas não encontro companhia...
O que seria do mundo se não houvesse moças bondosas e extrovertidas, dispostas a salvar de sua solidão, os tímidos e inseguros como o nosso amigo J.R., afinal, mulher que esperasse muito por uma ousada atitude de sua parte, certamente morreria na praia.
Salvador, 7 de fevereiro de 2012.
5 comentários:
"Cris, você é o cara! Um abraço."
Augusto Pitta
Captou direitinho a dificuldade de um tímido. Adorei!
Monica Aroucha
Massa! Adorei,velho!.....
Ernani melo
Mas esse vale a pena!
Beijos c/ sabor de domingo ........
Odete Lima
Gostei muito Cristiano. Parabéns!!
Daniele Helfstein
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