Nunca vi tanta gente preocupada com o que enfia na boca. Refiro-me a alimentos, é claro. Querem estar saudáveis. Viver com saúde é fato inquestionável. Não dá para imaginar uma vida feliz ao contrário. Vivemos em épocas em que todos desejam esticar o próprio prazo de validade e com mais saúde. Ou queremos viver com mais saúde e por isso viveremos mais um pouco? Difícil saber o que realmente importa. Viver mais ou ter uma vida saudável. Mas a que custo?
Tenho amigos que levam isto tão a sério que terminam exagerado na medida. Não comem esta ou aquela comida na mesma refeição. Não faz bem à saúde, dizem, embora sejam alimentos saudáveis. Nunca ouvi falar de ninguém que tenha morrido por misturar comidas no prato. Agem como se fossem membros de alguma nova religião. Não comem nada que não seja orgânico. Como era possível o mundo antes dos orgânicos? A palavra transgênico soa-lhes como uma blasfêmia, um verdadeiro pecado. Já baniram há muito tempo qualquer tipo de carne do cardápio. E como suas escolhas terminam sendo limitadas, passam a maior parte do tempo imaginando o que vão comer e como consegui-lo, uma vez que o seu saudável alimento não se encontra em qualquer mercado ali da esquina. Para obtê-lo, exige-se certo esforço extra. Ser saudável, dá trabalho, acreditem. Não comem isso, não comem aquilo. Com tantas restrições, impossível convidá-los para comer fora. Terminam cozinhando suas próprias refeições porque só eles é que sabem como aproveitar melhor o alimento. Hum... ensopadinho de abobora com chuchu, sem sal, acompanhado de arroz integral orgânico e caldo de repolho, uma delicia! Esta gororoba deve ser até saudável mesmo, mas duvido que seja esta coca-cola toda. Embora se alimentem bem, segundo seus conceitos, eles estão sempre se queixando de fome e de cansaços misteriosos. Mal humor. São magros como nordestinos fugindo da seca no sertão. E eu que ouse lhes dizer que tudo isso é o efeito da porra da dieta maluca em que se meteram. Já ouvi caso de um sujeito que não comia nada, queria se alimentar apenas da luz solar. Quase virou vegetal! Lembrei de um casal de amigos do papai que fazia macrobiótica. Pareciam duas almas penadas. Quando vinham almoçar em nossa casa de praia, quase todo fim de semana, faziam enormes pratos de feijoada com todas as carnes e ainda lambiam os beiços. Mas quanta fome!
Existem aqueles que simplesmente não pensam no assunto. Não estão nem ai. Não se importam com o que comem. Pedem no Mcdonalds o tradicional sanduíche bombando em calorias e colesterol que faz coronárias tremerem de pavor. Em seguida, ouvem da balconista depois de pedirem o refrigerante. Diet ou normal? Como se isso fizesse alguma diferença! Fazem, então, as pazes com a consciência ao pedirem uma diet, pois afinal, a saúde vem em primeiro lugar! Cada um tem a sua própria dieta saudável e uma boa explicação para ela. Neste caso, o açúcar dos refrigerantes é que é o grande veneno.
A indústria alimentícia aproveitou essa onda – minha intuição diz que foi ela quem a inventou – e encheu as prateleiras dos mercados com produtos industrializados com pinta de saudáveis, acondicionados em embalagens ecologicamente corretas. Olha como eles são preocupados com a saúde do planeta, até a embalagem é feita de material reciclado. Difícil saber qual a diferença. Diet, light ou orgânico. Todos garantem fazer bem à saúde, evitam que pessoas engordem e prometem vida longa. Ao contrário de elas simplesmente fecharem a boca, basta comer estas maravilhas.
A verdade é que nunca saberemos quanto tempo a mais viveremos depois de ingerir tanta saúde, até porque ninguém sabe o dia que vai prestar contas com o criador. Ou se todo aquele esforço de só comer alimentos saudáveis e negação aos prazeres da carne terá realmente valido a pena. Cada um de nós tem uma conformação orgânica diferente. Uns são altos, outros são baixos. Alguns são magros, mesmo que comam um boi na hora do lanche. Outros engordam comendo apenas uma ervilha. Meu vizinho octogenário fuma feito uma chaminé desde os catorze, está vendendo saúde. Outro mais jovem, amigo da família, foi levado pelo câncer nos pulmões sem nunca ter posto um único cigarro na boca. Fico imaginando até onde tanto cuidado realmente faz alguma diferença. Não sugiro que as pessoas saiam por ai fazendo de tudo, mesmo sabendo que um dia terão de morrer mesmo. Aproveitem que a vida é curta, mesmo só comendo diets, lights e orgânicos!
Nunca tive gripe ou outro tipo de doença. Sou saudável, mesmo comendo de tudo. Não exagero em nada. Não sei quantos anos viverei, mas espero não quebrar nenhum recorde. Detesto comidas diets ou lights, e não sei o gosto de um alimento orgânico. Dizem que é gostoso, não duvido. Uma alface orgânica tem o sabor de alface mesmo, já me prometeram. O tomate, então, nem se fala. Mas como eu como tudo temperado, jamais saberei a diferença. Quando estou em lugar que me oferecem algo light ou diet, sempre recuso polidamente. Mas em seguida, me explico. Minha filha, não como nada muito saudável ou que prometa me fazer viver mais tempo. Tudo em excesso faz mal, mesmo comidas saudáveis, sabia? Tenho medo de ficar saudável demais, ter um piripaque e morrer antes da hora. De qualquer forma, espero morrer doente, e não saudável.
Este assunto tem visitado meus pensamentos ultimamente. Mas não imaginem que estou querendo seguir algum tipo de dieta. Nada disso. Apenas penso no assunto, como penso em outras coisas, como em roubalheiras em Brasília, por exemplo. Outro dia me vi na seguinte situação bizarra. Fui até a loja comprar veneno para rato. Têm aparecido uns enormes e bem saudáveis aqui por casa. Eu gosto de animais e jamais faria mal a eles, mesmo no caso de ratos. Preocupado com o bem estar dos roedores, pedi um veneno orgânico, pois minha intenção era de exterminá-los, mas sem fazer mal à saúde deles!
Rio Vermelho, 26 de março de 2009.