domingo, 1 de janeiro de 2012

Conto de Natal ou de como gentileza gera gentileza.

Hoje é Natal e acordei bem disposto. E como não nevava lá fora, resolvi dar uma longa caminhada para queimar as calorias adquiridas com os excessos da noite passada, tendo me empanturrado de peru, panettone, frutas importadas, vinho, sobremesas e outras gulodices natalinas. Este ano, o meu amigo M.M. presenteou-nos com um maravilhoso peru assado, embora eu desconfie que aquele bicho fosse, na verdade, um filhote de avestruz. Estava delicioso, no entanto, e, devido às suas proporções avantajadas, provaremos uma variedade infinita de receitas com sobras de peru nos próximos dias.

Então fui fazer a minha caminhada natalina sob o escaldante sol de verão e lá pelas tantas aproximou-se um rapaz bem apessoado montado numa motocicleta, sem o obrigatório capacete. Usava um desses óculos escuros modernosos que fazem a pessoa parecer um besouro de ficção científica.

— Bom dia, senhor. Feliz Natal! – ele disse.

Eu gosto muito da cordialidade entre pessoas que não se conhecem porque isto me faz eu me sentir como um cidadão que vive numa comunidade onde moram pessoas civilizadas.

— Bom dia. Feliz Natal! – respondi.

— Isto é um assalto. – disse educadamente apontando um revolver do tamanho de um canhão em minha direção.

Ser assaltado nunca foi o meu forte e, por isso, não sei como me comportar em tais situações.

— Jura? Em que posso ajudá-lo?

— Passa a carteira. – respondeu o assaltante educadamente.

— Eu não trago carteira comigo quando venho caminhar. Tudo que tenho são cinco míseros Reais para tomar uma água de coco e pegar o ônibus de volta.

— Só isto? – pareceu aborrecido.

Eu tinha no pulso um relógio novinho em folha que Papai Noel colocou em meu sapatinho que deixei na janela do quintal, e que me custou uma pequena fortuna cujas prestações restantes ficarão como herança para meus herdeiros. Ele tem de tudo que você possa imaginar, inclusive mostra as horas e a data.

— E este relógio aí? Deve ser bem caro.

— Nem tanto. – tentei enrolá-lo, mas ele era um connoisseur de grifes caras.

— É muita imprudência do senhor andar por aí com um relógio destes, não sabe que a cidade anda cheia de assaltantes?

— Realmente, ouvi falar... Só não esperava encontrar com um deles justamente no dia do Natal. Minha mãe bem que disse para eu não sair de relógio, mas como sou um cabeça dura, não lhe dei ouvidos.

— O senhor deveria seguir os conselhos das pessoas mais velhas, elas sabem o que dizem. Como não tem dinheiro, vou ser obrigado a levar o relógio.

— Eu entendo o que o senhor está dizendo. Realmente, é muito desagradável fazer as coisas por obrigação. – disse-lhe despedindo-me do relógio.

Ele me examinou de cima a baixo e fixou os olhos no par tênis seminovo que eu usava, especial para caminhar e que promete queimar calorias, melhorar a postura e endurecer o bumbum.

— Vou levar o tênis, também. – informou o assaltante.

— Mas até os tênis? – disse retirando-os, pois não queria provocar a sua susceptibilidade.

Depois de me depenar ele ainda foi gentil.

— O senhor deseja uma carona para algum lugar?

— Obrigado, mas não quero desviá-lo de seu caminho, além do mais o senhor deve ter muito serviço pela frente.

— Realmente estou um pouco abafado. Esta época do ano, eu sempre trabalho dobrado. Dá próxima vez, tenha mais cuidado e feliz ano novo!

— Vou seguir o seu conselho. Feliz ano novo.

Ainda bem que desta vez eu não saí com a intenção de fazer fotografias usando a minha Cannon profissional!


Rio Vermelho, 25 de dezembro de 2011.

7 comentários:

Sarnelli disse...

kakakakakakaka....!!!! e depois dizem que os raios não caem duas vezes no mesmo lugar ! O seu problema , meu caro Cris, é ter a aparência de um intelectual rico e portanto a sua figura , além de não passar despercebida, atrai os amigos do alheio. Desse jeito, você vai fazer amizade com um monte deles ...Já procurou saber onde Papai Noel comprou o relógio ?Aqui para nós, não é chato voltar descalço para casa ? rsrsrsrsr

Eu acho que você preciza se benzer !

Anônimo disse...

Que azar danado," é ficção ou realidade ou a mistura dos dois rsrs ? Fiquei curiosa agora rs, bom te ler ! Bjo"
Catia Lima

Anônimo disse...

Ola Cristiano! Obrigada pelas divertidas leituras que você nos brinda,
Gosto do teu jeito de escrever, e dou muita risada (coisa que não faço
facilmente)
Um feliz 2012 para você!
Silvana Grappi

Anônimo disse...

Vão-se os anéis e ficam os dedos,Cris. Tênis e relógio, por mais caros que sejam, podem ser adquiridos depois - e os serão - quanto à sua vida... é difícil dizer.
Dora Dias

Ana Martha Falzoni disse...

Melhor caminhar descalço da próxima vez, rsrs.

Anônimo disse...

Depois de tudo, descalço, sem "orológio" e o cincão, onde gastar as calorias? Q Papai Noel, Cris!

ABÇ

Mario

Hellio Campos - Mestre Xaréu disse...

Gostei muito do texto, realidade ou ficção não importa. O texto é divertido, bem humorado e retrata o cotidiano em que vive os soteropolitanos. Não esquecer que generosidade gera generosidade.