quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

O Dia Em Que Derrubei Um Mike Tyson

Eu gosto de gastronomia a ponto de me aventurar a experimentar algumas receitas simples de vez em quando. Sim, porque a minha ambição pela arte culinária não vai muito além de recriar algumas receitas fáceis de fazer que não frustrem o entusiasmo do chef amador que existe em mim. Outro dia mesmo eu participei de um workshop sobre risoto oferecido pelo SENAC e tive a grata surpresa de descobrir que aquilo que eu fazia com tanto empenho nunca foi um risoto.
         E foi conversando sobre pratos exóticos com um amigo natural do sertão de Minas Gerais que me veio a lembrança de um episódio em minha vida cuja relação com a culinária é nenhuma. Meu amigo mineiro falava de como sua mãe sabia fazer um ensopado de tatu como ninguém e de como ela até aproveitava o rabo do bicho. Não sou fã de tatu, jamais comi um e creio que este não está na minha lista de 100 coisas para comer antes de morrer. Considero-o até um animal simpático e até já tivemos um desses em nossa casa da Rua do Céu quando eu era criança. Mas desde que tomei conhecimento que o animal fazedor de buracos na terra apreciava cadáveres a sete palmos como iguaria e é um transmissor da doença de Lázaro, desenvolvi uma repulsa em tê-lo à minha frente em um prato sob qualquer receita que seja.
         Outra especialidade que a mãe do meu amigo tem é fazer um prato de nome tão incomum para nós baianos como ele próprio. Chama-se galopé e é feito a partir da mistura de dois cozidos, um de pés de porco frescos e outro de um cozido de galo duro. Minhas papilas gustativas salivaram encantadas com a ideia de prová-lo. Deve ser aquele tipo de comida que agente come e sua ao mesmo tempo e depois vai se deitar numa rede na sombra o resto da tarde para fazer a digestão. Entretanto, esta é uma receita que jamais terei a oportunidade de experimentar, a menos que eu vá parar num rincão de Minas. Eu me perguntei em nome de Deus onde eu conseguiria pés de porco frescos e ainda mais um galo velho e duro para abater aqui em Salvador. Naquele momento, lembrei-me de um certo galo.
         Eu vinha de uma fazenda onde fui passar o fim de semana com amigos e já era noite quando passávamos em frente à CEASA do Rio Vermelho. O carro vinha a certa velocidade, cheio de gente e malas e eu estava ao volante. Estávamos exaustos da longa viagem, já era noite, mas eu mantinha os olhos firmes e atentos na estrada. Ao passar em frente a um ponto de ônibus, fui surpreendido com a presença de um animal no caminho logo à nossa frente. O farol do carro devia tê-lo hipnotizado, pois ele estava imóvel como uma estátua e pude ver a potente luz do carro refletida em seu pequeno olho. Ele tinha um de cada lado da cabeça e estava de pé de perfil para nós. Era um majestoso e robusto galo. Naquele instante, meu pensamento foi ágil e rápido, calculei que seria impossível frear o automóvel sem causar um acidente e desviar para qualquer um dos lados também resultaria numa tragédia. Com o coração apertado, segui adiante e até hoje me lembro de sentir uma batida surda no chassis do carro. Aquele foi o meu primeiro e único atropelamento até os dias de hoje.
         Um amigo sentado no banco ao meu lado testemunhou o terrível episódio e ainda viu o dono do animal esbravejando feito um louco no ponto do ônibus.
         — Corre, Cris! – ele gritou exaltado. – Você matou um galo de briga, o dono está puto segurando a faixa de campeão!

         Rio Vermelho, 10 de fevereiro de 2014.

Um comentário:

JAIR disse...

Legal Cristinao...valeu! abs jair