Chegara aos 30 e queria ser mãe
a todo custo. A maternidade semeava em seu corpo o desejo irrefreável de
conceber. Era saudável, informou-lhe a doutora. Só tinha um obstante: precisava
de um pai para a criança. E de um marido para ela. Tinha de ser de papel passado,
ainda por cima. Jandira era uma mulher convencional neste aspecto. Nada de
produção independente. Uma criança precisava de uma mãe. E de um pai. Antes de
realizar o sonho da maternidade, precisava arranjar um marido.
O fato de ser a chefe do
departamento de pessoal de uma grande empresa era uma situação vantajosa. Dezenas
de homens que lá trabalhavam, poderiam ser os candidatos ideias para aquela
empreitada. Bastava procurar na ficha dos solteiros, aquele cujo currículo
enquadrava-se no cargo oferecido. Jandira era uma mulher obstinada.
Pesquisou na poeira de arquivos
até encontrar um Eduardo Jorge. Locado no departamento de projetos no quinto
andar, era cinco anos mais velho, economista e já fora promovido duas vezes em quatro
anos de empresa. Não demoraria a se tornar o chefe do departamento. Era
pontual, nunca faltava e era tido por seus superiores como um profissional ambicioso,
trabalhador dedicado e criativo.
Jandira procurava por um marido
e por um pai para a sua planejada cria como quem selecionava um candidato a uma
vaga na empresa. Analisou o seu psicoteste, ficou satisfeita. Não era maluco. Só
precisava saber se ainda continuava solteiro. Mas isto era fácil. Convoco-o a
comparecer ao departamento para uma atualização de cadastro.
Depois de confirmar em sua
ficha a condição de solteiro, Eduardo Jorge aceitou, primeiro surpreso e, em
seguida, com um pingo de desconfiança, o convite de Jandira para que jantasse
em seu apartamento que era um novinho em folha e no qual reservara para a futura
criança o quarto ao lado do seu. Mandara pintá-lo de rosa, pois queria era uma
menina.
Na noite combinada para o
jantarzinho, a anfitriã preparou ela mesma um belo linguado assado ao molho de alcaparras
na manteiga. Tomou um demorado banho de sais, passou creme hidratante pelo
corpo inteiro para deixar a pele deliciosamente fresca e macia. Ficou mais
temperada que o prato principal. Vestiu uma calcinha nova de rendinha e por
cima jogou um vestido quase transparente. Pelo visto, Jandira planejava um
jantarzão.
Ao chegar pontualmente no
horário combinado, Jandira fez questão de mostrar a Eduardo Jorge o apartamento
novo. Aqui é a sala, ali é a cozinha, aquele é o meu quarto e este ao lado do
meu é o quarto do meu futuro bebê, não que eu esteja grávida ou coisa assim,
mas estou planejando ter um filho em breve. Tanta informação assim, fez Eduardo
Jorge dar um pulo para trás. Epa! Ele passou o resto da noite em alerta, como
uma presa à espera do golpe de seu algoz.
Depois do delicioso jantar,
Jandira serviu-se como sobremesa. Desconfiadíssimo, Eduardo Jorge, para não
fazer uma desfeita à sua anfitriã comeu-la ali mesmo na sala, mas sem querer repetir
o prato. Jandira, sem reparar na falta de apetite do rapaz, contou-lhe o seu
plano de casar e ter um filho ainda naquele final de ano. Ao ouvir aquela
confissão, o rapaz engoliu em seco e teve a incomoda sensação de que, de alguma
forma, ela queria que ele fizesse parte daquela tramoia. Ele, entretanto, para
não azedar a noite mais do que, para ele, já tinha se tornado indigesta, deixou
para fazer qualquer comentário só antes de ir embora.
Ao se despedir, no final da
noite, Eduardo Jorge, informou-lhe que também tinha um plano. O de nunca se
casar nem aqui e nem na China. Desejo-lhe boa sorte, ele disse encabulado. Você
está indo muito bem em seu plano. No ritmo que você vai, irá varrer todo o
quinto e o sexto andar num piscar de olhos!
Salvador, 14 de outubro
de 2014.
4 comentários:
kkkkkkkkkkkk e otimo!!
kkkkkkkkkkkk e otimo!!
Cristiano,
Parece que o Eduardo é o próprio escritor, que continua sem casar e parece que nem na China vai acontecer.
É brincadeira, como sempre simples, elegante e engraçado são seus contos.
Um abraço, Paulo.
Cristiano,
passei pelo Face e vi a sua chamada. Há muito tempo que estava esperando alguma coisa sua no ar. Não perde o estilo .Parabéns.
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