A mãe era louca de pedra. Desde
o divorcio, há mais de oito anos, tomara aversão ao sexo oposto. “Homem não
presta”, repetia às três filhas pequenas incutindo-lhes aquele medo irracional.
“Fiquem distante deles que só causam sofrimento.”
A separação foi provocada pelas
infidelidades do marido, um incorrigível mulherengo, a quem ela amava tanto a
ponto de fingir-se de cega. No final, mesmo assumindo uma postura resignada, ele
a trocou por outra a metade de sua idade. Certo dia, ele simplesmente arrumou as
malas e saiu dizendo assim: “vou ali comprar cigarro e não volto mais.”
O fim do casamento arruinou a sua
vida. Deixou o trabalho, passava o dia prostrada sobre a cama ou sentada indiferente
em frente da televisão. Descuidou-se das filhas. Quando, finalmente, tomou
novamente as rédeas de sua vida, parecia que tinha ficado com um parafuso a
menos. Seu comportamento era de gente que não era boa da cabeça.
O tempo passou, as filhas se
tornaram belas moças. Mais um motivo para que ela se preocupasse. Ordenou ao
porteiro do prédio onde residiam que não deixasse homem algum subir durante a
sua ausência, nem mesmo entregador de pizza! Vigiava as filhas com obsessão para
que não se envolvessem com aquela raça masculina. E não passassem pelo mesmo
sofrimento pelo qual passou.
Tanta preocupação assim era
querer mudar a natureza das coisas. Ora, as moças eram jovens e estavam naquela
idade de desejar estar com rapazes. Querer impedi-las, era como tentar apagar uma
fagulha assoprando-a, o efeito pode ser o oposto. A faísca torna-se brasa e
depois vira fogo. As moças ficaram mais curiosas sobre o assunto.
A mais linda de todas as três
filhas, era também a mais nova. Ela era a mais comunicativa e a que mais fazia
amizades, notadamente com os rapazes do bairro, a quem concedia os seus favores
sem maiores cerimônias. Ela tinha o estranho hábito de anotar num caderninho de
capa cor de rosa, o nome e a data do rapaz com quem ficou, acrescido de um breve
comentário sobre suas impressões: grande demais, meio torto, pequenininho. E sobre
as suas habilidades na arte do amor: apressado, lerdo, carinhoso, estilo
lenhador.
Já a do meio, não era tão
levada quanto a caçula, mas era exímia na arte da dissimulação. Gostava de
colecionar garrafinhas de shampoos que levava dos motéis por onde passava. E
quase sempre pedia dinheiro emprestado que jamais era devolvido.
A mais responsável era a mais
velha, a única que levara a sério os estudos e que se formara na faculdade. Por
este feito brilhante, era o orgulho da mãe.
Certo dia, no entanto, ao
bisbilhotar a bolsa da mais velha, cuidado que costumava ter com as três filhas
indistintamente, tomou um susto ao encontrar entre as páginas de sua agenda,
uma cartela de anticoncepcional. Aquilo a deixou indignada. A pesar de todos os
seus cuidados e recomendações, a filha já estava se perdendo na luxúria!
A menina, ao chegar em casa,
tomou um susto ao abrir a porta e encontrar a família, tios, tias e agregados,
todos reunidos.
— Ué, quem morreu? – ela quis
saber assustada.
— Eu chamei seus tios porque
queremos ter uma conversa séria com você. – a mãe falou sem rodeios.
— Que conversa, minha mãe? Que
foi que eu fiz, agora?
— Esta manhã, espanando a poeira
do quarto, deixei cair sua bolsa. Algumas coisas se espalharam pelo chão. O que
isto estava fazendo em sua bolsa? – gritou a mãe agitando a cartela de comprimidos
em sua mão.
A menina perdeu a cor da face.
E antes que encontrasse uma boa resposta, a mãe vociferou. Estava descontrolada.
Parecia que o mundo vinha abaixo.
— Vejam, só, ela já está no
anticoncepcional! Era só o que me faltava, minha filha diplomada na faculdade já
está fazendo sexo por aí. E nem namorado ela tem. Ai meu Deus, eu tanto que falei
para as minhas filhas ficarem longe dos homens e justamente a mais velha, a
mais responsável, a que devia dar o exemplo, já está fazendo sexo! Meu Deus,
aonde foi que eu errei? Minha filha esta transando por aí. Ai meu Deus, ela já está
estragada. Menina, você vai ficar viciada em sexo! Isso não tem fim, depois que
começa, fica querendo toda hora, isso é uma coisa que não sai mais da cabeça, olha
o que eu te digo! Meus irmãos, – disse voltando-se para os irmãos, irmãs,
cunhadas e cunhados, o circo todo – me ajudem a colocar juízo na cabeça dessa
moça, se não, ela vira uma perdida na vida!
Enquanto falava sem fazer pausa
para recobrar o folego, agitava dramaticamente os braços. Os cabelos crespos e
prateados se desprenderam caindo sobre os ombros, emprestando ao espetáculo a
cena de uma mulher ensandecida.
— Ora, mamãe, não seja ridícula. Se a senhora perdeu o tesão pelos homens, o meu está apenas começando! – disse tomando de volta as suas pílulas.
— Ora, mamãe, não seja ridícula. Se a senhora perdeu o tesão pelos homens, o meu está apenas começando! – disse tomando de volta as suas pílulas.
Naquela mesma noite, a mãe se
trancou no quarto passando a chave como sempre fazia. E tirou de uma brecha por
detrás da pia do banheiro, um grande objeto cilíndrico emborrachado de aparência
desgastada pelo uso frequente e ao qual recorria varias vezes ao dia para
aplacar os seus momentos de fúria.
Rio Vermelho, 07 de
dezembro de 2014.
2 comentários:
Como sempre, um final inesperado !
Muito bom , Cristiano , será que você só pensa naquilo ?
Cristiano, como sempre maravilhoso.
Um abraço, Paulo.
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