A moça estava feliz porque era uma linda manhã e
porque era bom estar naquele estado de contentamento. Ela sentia que era
possível que as coisas dessem certo apenas com um sorriso sincero e pensamentos
positivos, era como se todo o universo conspirasse a seu favor. No entanto, era
mais provável que o real motivo de tanta felicidade fosse o fato de ela estar
apaixonada e na noite anterior o namorado a ter levado para comemorarem juntos o
dia do seu aniversário. Ele a levou para jantar num restaurante chique e a presenteou
com um smartphone caro, seguido de uma noite maravilhosa num hotel cinco
estrelas. Naquela manhã ensolarada, ela acordou mais tarde, como era de se esperar,
e foi para a faculdade tentar assistir a última aula. Durante a viagem de ônibus,
ela ainda enviou uma mensagem de texto para o namorado de seu novo smartphone para
lhe agradecer pela noite inesquecível e pelo presente de aniversário.
Ao começar a aula, ela percebeu que tinha sido bobagem
ter ido à faculdade, porque os seus pensamentos estavam longe, nos
acontecimentos da noite anterior e o seu corpo ainda continuava embriagado pelo
estado de languidez que o namorado tinha deixado e que a impedia de se concentrar
na aula. Cada detalhe da noite anterior se repetia em sua mente como num filme,
o jantar delicioso, o vinho excelente, o presente embrulhado num papel fino com
um laço cor de rosa, acompanhado de um cartão no qual ele escreveu uma poesia para
ela, o resto da noite fazendo amor. Ela estava convencida de que o seu namorado
era um homem maravilhoso e ela estava a cada dia mais louca por ele.
Mesmo não conseguindo prestar atenção à aula, ela
ficou até o fim, perdida em recordações e, em seguida, voltou para casa
planejando dormir o resto da tarde. Caminhou até o ponto de ônibus debaixo do
sol abrasador, mas nem se importou porque tudo estava maravilhoso para ela. Uma
pequena aglomeração de pessoas que aguardava no ponto tentava se proteger dos raios
solares buscando sombra debaixo do abrigo e ela tentou arranjar um cantinho
entre elas. Ela sentiu vontade de dizer mais uma vez ao namorado que o amava e
resolveu enviar-lhe outra mensagem. Enquanto digitava aquele texto, um rapaz aproximou-se
e pediu as horas. Ela teve a impressão de reconhecê-lo, talvez da faculdade, e sorriu
para ele amistosamente, depois buscou na tela do aparelho pelas horas. E antes de
ela lhe responder, ele encostou um objeto contundente entre suas costelas que lhe
provocou dor e ordenou que lhe entregasse o aparelho sem fazer alarde.
Ela teve um sobressalto e conteve o gemido. Apenas
deixou que o rapaz tirasse de sua mão o aparelho, pois o seu estado de choque a
tinha desprovido de reação. Em seguida, ele sumiu na multidão do mesmo modo inesperado
com que surgiu, e ela ficou ali, de pé, com as pernas trêmulas.
Quando o ônibus veio finalmente, o que lhe pareceu
durar uma eternidade, ela correu na frente de todos e foi a primeira a entrar
na condução. Seu coração ainda palpitava e ela soluçava sufocando o choro. Um
senhor que estava de pé logo atrás enquanto ela pagava a passagem, percebendo o
seu mal-estar perguntou se ela estava passando bem. Ao que ela respondeu que
tinha acabado de ser assaltada no ponto do ônibus – em plana luz do dia e em
meio à multidão. Foi quando não contendo as lágrimas, ela desabou a chorar
convulsivamente. Levaram o celular que meu namorado me deu, ela disse atraindo
olhares de simpatia e consternação. Alguém se levantou e ofereceu-lhe o lugar e
ela sentou ainda um pouco trêmula. Em seguida, cobriu o rosto com as mãos escondendo
o sofrimento e abafando o choro. Passados alguns instantes, depois de se controlar,
levantou a cabeça olhando para o vazio com um olhar de desilusão e derrota.
Rio Vermelho, 24 de janeiro de 2016