sábado, 9 de janeiro de 2016

Uma Indireta

Era a hora do almoço. E a moça, pedindo licença educadamente, sentou-se à mesa trazendo uma bandeja. O restaurante comercial ainda estava vazio, por isso ela bem poderia ter escolhido qualquer uma das mesas desocupadas disponíveis, mas ela preferiu justamente aquela em que também sentava-se um belo rapaz. Este estava tão entretido com a sua comida que mal percebeu quando ela sentou-se na cadeira à sua frente.

Com uma mão, ela brincava com a comida com a ajuda do garfo e com a outra conversava ao aparelho celular. “Acho que não vou a lugar algum, – ela dizia com uma expressão de desapontamento. – não tenho companhia para ir, eu simplesmente não tenho com quem ir. Eu queria tanto ir ao show na Praça Cairú, mas não consigo encontrar nenhuma companhia. ...Nãooo, não querida, eu não consegui encontrar um homem para ir comigo, todos viajaram este final de ano.”

Conversas ao celular em locais públicos são como se confessar ao padre em transmissão em cadeia nacional, deveria ser um momento privado, mas todo mundo participa quer queira ou não. E pelo tom de voz da moça, ela parecia não ter a menor intenção de fazer daquele seu infortúnio um segredo guardado a sete chaves. O rapaz não pôde deixar de ouvir aquela história e deu uma olhada na moça pelo canto do olho, rápida o bastante para não ser percebida. A moça repetiu mais uma vez que não tinha companhia masculina para a virada do ano e lamentava ter de ficar em casa sozinha.

— Mas que coisa, – disse o rapaz ao perceber que a conversa terminou. — uma mulher tão bonita como você, da sua qualidade, deveria era estar esnobando convites.

— Pois, é. – ela disse fazendo ares de vítima.

— Se eu não fosse um homem casado e fiel à minha mulher, eu ia passar esta virada do ano com você e a gente ia se divertir muito!

— Nossa, fiquei até curiosa. – ela disse com um brilho de esperança nos olhos.

Mas o rapaz se levantou da mesa, pois já tinha terminado de comer. Desejou boa sorte à moça com um sorriso encorajador que a fez se derreter e foi embora. Ela, entretanto, não esmoreceu, estava decidida a virar o ano nos braços de um homem, qualquer um que valesse a pena. A sorte parecia que estava ao seu lado, entretanto. Mal o rapaz foi embora, outro ocupou o seu lugar cumprimentando-a educadamente.

A moça, que não desgrudava do aparelho celular, conversava novamente. “Acho que não vou a lugar algum, – ela dizia com uma expressão de desapontamento. – não tenho companhia para ir, eu simplesmente não tenho com quem ir. Eu queria tanto ir ao show na Praça Cairú, mas não consigo encontrar nenhuma companhia. ...Nãooo, não querida, eu não consegui encontrar um homem para ir comigo, todos viajaram este final de ano.”

O rapaz à sua frente tirou os olhos de seu prato e observou atentamente aquela bela moça que parecia largada no mundo. Ouviu cada palavra daquela conversa e, ao final, ele se dirigiu a ela:

— Sabe, eu trabalho na assistência técnica da marca deste seu celular e nunca tinha visto antes alguém conseguir conversar com o aparelho desligado. – ele disse com um sorriso maroto que pegou a moça de surpresa. – Mas eu aceito o seu convite para passarmos a virada de ano juntos!


Rio Vermelho, 6 de janeiro de 2016.




3 comentários:

Sarnelli disse...

Gostei da insistência da moça . Os seus contos são sempre bons e leves e nos obrigam a leitura até o final. Parabéns. Hoje eu não pude ir. Fiquei de " prantão "...

Anônimo disse...

Bacaníssimo esse seu texto, Cristiano!

Forte abraço!
Flávia

Anônimo disse...

Parabéns!!!
André Becker