Desejava a vizinha
ardentemente. Sonhava com a mesma acordado a ponto de dedicar-lhe memoráveis punhetas.
Mas ele não tinha esperanças, achava-se velho demais, além do mais, que mulher jovem
iria querer ir para a cama com um homem que tinha quase a idade de seu avô?
Talvez só por dinheiro, mas ele não tinha tanto assim sobrando para aquele tipo
de aventura, o jeito era economizar.
Astolfo
era um sujeito de porte grande, proprietário de uma barriga saliente cultivada com
a mistura de cerveja com petiscos; possuía, também, um bigode comprido e branco
como o marfim e que lhe caia pelos cantos da boca fazendo-o parecer um velho
leão marinho. Para completar a descrição, puxava da perna esquerda por causa de
um diabo de artrose que não lhe deixava em paz e que tinha dias que lhe doía de
fazer perder o sono e de tirar o apetite, mas não tomava remédio algum, tinha
horror. E o remédio para matar aquele tipo de dor lhe tirava o tesão, apesar de
este não lhe ser de muita serventia nos últimos tempos, mas tinha esperança que
Jandira, a sua memorável jovem vizinha, aceitasse a oferta que lhe faria quando
a oportunidade chegasse.
Jandira era uma jovem e bonita morena de pele da cor do
tamarindo maduro, possuidora de quadris largos e lábios carnudos e gordurosos. Astolfo
a conhecia só de cumprimentar desde os tempos de moleca, mas nunca lhe deu a
devida atenção, tinha o corpo miúdo de criança. Mas quando ela se tornou moça e
o corpo floresceu numa mulher adulta e admirável, ele passou a cobiçá-la com
olhos de lobo velho faminto. Da janela de seu quarto no segundo andar de um
velho sobrado no Rio Vermelho, ele podia contemplar Jandira lavando a roupa no
tanque no quintal de sua casa que era colada à sua. Ela ficava de costas para
ele curvada sobre o tanque, metida num minúsculo short que sumia pelo rego das carnudas
nádegas, isto quando não vestia uma apertada saia curtíssima que lhe acentuava
a perfeição dos quadris e das pernas. Tinha vezes que ela esfregava as roupas agachada
sobre uma bacia de frente para a janela do velho, aí sim o espetáculo era uma
belezura. Astolfo podia ver pelo generoso decote de sua blusa os fartos peitos
sacudindo de um lado para o outro como dois melões maduros ao fazer o esforço com
os braços, e se ela estava de saia era uma loucura, ele podia jurar que via a
ponta da calçola guardando-lhe a preciosa joia.
Nos fins de tarde, Astolfo não perdia o horário de ir até a
padaria na intenção de encontrar casualmente com Jandira que ia comprar o pão para
o café da noite. Ele fazia questão de cumprimentá-la, na esperança de que um
dia ela lhe desse ousadia e, por isso, não passava sem dizer um galanteio. “Boa
tarde! O amarelo lhe cai muito bem.” Dizia elogiando-lhe o vestido. “Tá de
corte novo de cabelo? Ficou parecendo uma princesa!” Que mulher não gosta de um
elogio, mesmo vindo de um velho barrigudo e bigodudo? Um dia ele veio do
mercado do peixe da Praia de Santana, trazia um pequeno balde quase transbordando
de peixe agulha; cruzou com Jandira que olhou com curiosidade, Astolfo se
adiantou. “Tome aqui uma dúzia para você fazer um ensopado pra janta.” Colocou
num saco ali mesmo no meio da rua. “Eu gosto dele é frito!” Exclamou a moça
agradecendo-lhe, numa das raras vezes que lhe dirigia a palavra.
Jandira já tinha notado os olhares maledicentes daquele
velho, mas ela não se incomodava, pois sabia que ela era mesmo gostosona, que
ver não arranca o pedaço, fazia até bem à sua autoestima. O dono da mercearia
ao lado da padaria só faltava uivar quando ela passava de minissaia. O vigia da
casa lotérica e os outros vagabundos que lhe faziam companhia sentados na
calçada, também a olhavam com olhos de peixe morto, mas ninguém ousava
dizer-lhe gracinhas por uma questão de respeito, já que ela era uma moradora
das vizinhanças e o seu pai era um homem respeitado. Mas Jandira não era boba, sabia
que o velho Astolfo a espionava lá de cima de sua janela quando ela lavava a
roupa no tanque, por isso lhe fazia uma caridade, ia vestida com um shortinho apertado
e às vezes até uma saia bem justa pra testar se o coração dele aguentava ao ver
a ponta de sua calcinha quando se acocorava de frente para a bacia.
Certo dia, já tendo economizado bastante dinheiro, Astolfo muniu-se
de coragem. Tomou um belo banho, arrumou-se e, no final da tarde, foi até a
padaria encontrar casualmente Jandira que como sempre, foi comprar o pão. Na
saída da padaria, chamou-a num canto: “Menina, cheque aqui.” Ela se aproximou curiosa
e ele, à queima roupa, disse com todo o atrevimento mostrando-lhe um maço de
dinheiro graúdo: “Olhe, isso aqui é todo seu, se você me der uma chupada.”
Jandira tomou um susto e lhe lançou um olhar indignado. Controlou o tom da voz nervosa
para evitar fazer uma cena em público. “Mas o senhor está me ofendendo, viu? Quem
o senhor pensa que eu sou? Não sou dessas que faz estas coisas por dinheiro. O
Senhor está enganado comigo. Não vou lhe cobrar um só tostão, que por uma
questão de humanidade, não se nega um copo de agua ou um boquete a quem
precisa!”
Rio Vermelho, 14 de
maio de 2012.
2 comentários:
Cristiano, como sempre muito bom, desta vez um pouco do Jorge.
Um abraço, Paulo.
Caro Cristiano,
Adorei sua última postagem, tu desta vez norteou seu conto para o humor sensual que é minha leitura preferida.
Sabe como né, o sujeito passa dos sessenta (sou de 51)aí quanto mais devasso, impurio, lascivo, libertino, libidinoso, mais interessante a leitura fica - e também o jeito de viver -rrsssss.
Sei que tu escreves para pessoas de todo os tipos de gosto e deves atender a todos claro assim é o jornalismo, mas quando puderes, repita mais alguns assim bem apimentados como esse.
Eu já te falei em outra oportunidade né, que gosto muito de ler o blog do colunista do jornal Zero Hora (David Coimbra) e lendo agora o "por uma questão de humanidade" me fez lembrar bastante dele.
Parabéns.
Um abraço
Ademar Garcia
Postar um comentário