sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Viúva com v maiúsculo.


Era uma jovem, bela e chorosa viúva cujo saudoso coração selou com luto e amargura. Não quis mais saber de outro, o falecido foi o grande amor e, por fidelidade à sua memória, prometeu a si mesma jamais substituí-lo. Ah, como era solitário e vazio o seu coração carente do afeto e aconchego de um homem.
Uma dessas adversidades do cotidiano a fez deixar o automóvel no conserto aquela semana, e como tinha de ir trabalhar todo santo dia, não teve outra alternativa se não ir de ônibus, solução que, aliás, casou-lhe desagrado, uma vez que o transporte público não apenas era de má qualidade, mas insuficiente, tanto que nas horas cruciais do dia, uma multidão de passageiros se espremia em seu interior feito gado sendo transportado para o abatedouro; um horror.
A jovem e delicada viuvinha não estava acostumada àquele desconforto, que ela só usava o automóvel como meio de locomoção e não imaginava que uma viagem de ônibus de seu bairro até o centro da cidade, onde batia o ponto, pudesse ser algo tão desagradável. Logo no primeiro dia de sua lamentável saga, percebeu que viajar confortavelmente sentada era um privilégio para poucos, uma vez que ela embarcava no transporte já lotado no meio do trajeto. Concluiu, então, que dificilmente teria a sorte de pegar um assento vago ou de ter a grata satisfação de encontrar um cavalheiro já acomodado que lhe fizesse a gentileza de lhe ceder o lugar. Ajeitou-se de pé para não cair da melhor forma que pode, com uma mão segurava o corrimão preso ao teto e com a outra a bolsa que trazia rente ao corpo para livrá-la de gatunos.
No entanto, não partiu de um larápio a origem de sua indignação. A princípio, ela apenas julgou que fosse sua imaginação, mas devido à persistência da ação, concluiu indignada que algum safado estava se aproveitando de sua vulnerabilidade pelas suas costas, ou, mais apropriadamente colocando, pelo seu traseiro! Em meio àquela multidão de corpos que se apinhavam dentro do ônibus, sentiu que um corpo rijo e pulsante roçava insistentemente contra a sua bunda. Seu primeiro ímpeto foi olhar para trás e passar uma descompostura no descarado, mas depois temeu uma represália, uma violência física pior que aquela a qual estava sendo submetida. Sufocou o grito, os olhos encheram-se de lágrimas, indignada fez de conta que nada estava acontecendo. E como não encontrasse resistência alguma por parte da apetitosa moça, o devasso cidadão começou a bambolear os quadris com a cadência de um expert no assunto ao que a viúva, sentindo no traseiro aquela ritmada ginga, achou aquilo intolerável e fugiu dali, indo estacionar-se logo adiante em frente de outra mulher o dobro do seu tamanho. Mas que canalha, ela resmungou.
Ao longo do dia, ela não pensou mais no assunto e só na volta para casa, já de pé dentro do famigerado ônibus é que teve o pressentimento de que o mesmo libertino daquela manhã estava novamente de pé logo atrás de si, pois o mesmo abuso se repetiu. Que diabo, pensou a viuvinha. Mas logo ela percebeu que não se tratava do mesmo homem da manhã, pois sentiu que a sua pujança e mexida eram diferentes, concluiu resignada.
Aquela noite ela teve o sono agitado e sentiu calores entre as pernas como há muito não acontecia. Sonhou que estava, pois, de pé numa interminável viagem a bordo de um ônibus lotado de homens desfigurados que faziam fila logo atrás dela, esfregando seus rijos brutos contra sua bunda como se quisessem arrancar-lhe os couros, extraia-lhe soluços e provocava-lhe uma tremedeira incontrolável nas pernas. Na manhã seguinte, sua ida para o trabalho foi como se o tal sonho da noite anterior tivesse se repetido, pois o ônibus não apenas estava lotado de homens, como cada um deles parecia ter resolvido tirar dela uma lasquinha!
Um turbilhão de desejos e sensações confusas tomou de assalto os pensamentos da pobre viuvinha que se sentiu diferente naquela memorável semana, como se tivesse libertado de alguma coisa que guardava secretamente em seu interior. Mas para sua satisfação, o seu carro ficou pronto no dia combinado e o mecânico ainda lhe fez a gentileza de ir deixá-lo em sua casa pela noite. Seu sofrimento havia chegado ao fim.
Na manhã seguinte, tomou um bando demorado com sais e óleos para sentir a pele macia e depois perfumou-se com alfazema francesa. Vestiu-se cuidadosamente admirando-se no espelho, escolheu a lingerie mais transparente e delicada para, em seguida, mudar de ideia resolvendo que dispensaria o uso daquele artigo obsoleto. Sentiu-se linda, com uma beleza quase imoral, e quando finalmente ficou pronta para ir para o trabalho, foi lépida e fagueira para o ponto do ônibus!
Rio Vermelho, 3 de agosto de 2012.


Um comentário:

Anônimo disse...

Querido!!!!
Será que vocé pensou um pouquinho em mim escrevendo esta linda stória?
Eu adorei-a. Infelizmente os Austiacos nao sao atrevidos como os
Brasileiros
e mesmo eu resolvendo tomar o onibus todos os dias nao teria este
efeito.
Mas quem sabe, eu acho um "onibus austríaco", onde estes sinais de vida
acontecem!
Beijos para vocé meu amigo!
Karolina