Era uma jovem, bela e chorosa viúva
cujo saudoso coração selou com luto e amargura. Não quis mais saber de outro, o
falecido foi o grande amor e, por fidelidade à sua memória, prometeu a si mesma
jamais substituí-lo. Ah, como era solitário e vazio o seu coração carente do
afeto e aconchego de um homem.
Uma dessas adversidades
do cotidiano a fez deixar o automóvel no conserto aquela semana, e como tinha
de ir trabalhar todo santo dia, não teve outra alternativa se não ir de ônibus,
solução que, aliás, casou-lhe desagrado, uma vez que o transporte público não
apenas era de má qualidade, mas insuficiente, tanto que nas horas cruciais do
dia, uma multidão de passageiros se espremia em seu interior feito gado sendo
transportado para o abatedouro; um horror.
A jovem e
delicada viuvinha não estava acostumada àquele desconforto, que ela só usava o automóvel
como meio de locomoção e não imaginava que uma viagem de ônibus de seu bairro
até o centro da cidade, onde batia o ponto, pudesse ser algo tão desagradável. Logo
no primeiro dia de sua lamentável saga, percebeu que viajar confortavelmente sentada
era um privilégio para poucos, uma vez que ela embarcava no transporte já lotado
no meio do trajeto. Concluiu, então, que dificilmente teria a sorte de pegar um
assento vago ou de ter a grata satisfação de encontrar um cavalheiro já acomodado
que lhe fizesse a gentileza de lhe ceder o lugar. Ajeitou-se de pé para não
cair da melhor forma que pode, com uma mão segurava o corrimão preso ao teto e
com a outra a bolsa que trazia rente ao corpo para livrá-la de gatunos.
No entanto, não
partiu de um larápio a origem de sua indignação. A princípio, ela apenas julgou
que fosse sua imaginação, mas devido à persistência da ação, concluiu indignada
que algum safado estava se aproveitando de sua vulnerabilidade pelas suas
costas, ou, mais apropriadamente colocando, pelo seu traseiro! Em meio àquela
multidão de corpos que se apinhavam dentro do ônibus, sentiu que um corpo rijo e
pulsante roçava insistentemente contra a sua bunda. Seu primeiro ímpeto foi
olhar para trás e passar uma descompostura no descarado, mas depois temeu uma
represália, uma violência física pior que aquela a qual estava sendo submetida.
Sufocou o grito, os olhos encheram-se de lágrimas, indignada fez de conta que
nada estava acontecendo. E como não encontrasse resistência alguma por parte da
apetitosa moça, o devasso cidadão começou a bambolear os quadris com a cadência
de um expert no assunto ao que a viúva, sentindo no traseiro aquela ritmada ginga,
achou aquilo intolerável e fugiu dali, indo estacionar-se logo adiante em
frente de outra mulher o dobro do seu tamanho. Mas que canalha, ela resmungou.
Ao longo do
dia, ela não pensou mais no assunto e só na volta para casa, já de pé dentro do
famigerado ônibus é que teve o pressentimento de que o mesmo libertino daquela
manhã estava novamente de pé logo atrás de si, pois o mesmo abuso se repetiu.
Que diabo, pensou a viuvinha. Mas logo ela percebeu que não se tratava do mesmo
homem da manhã, pois sentiu que a sua pujança e mexida eram diferentes,
concluiu resignada.
Aquela noite
ela teve o sono agitado e sentiu calores entre as pernas como há muito não acontecia.
Sonhou que estava, pois, de pé numa interminável viagem a bordo de um ônibus
lotado de homens desfigurados que faziam fila logo atrás dela, esfregando seus
rijos brutos contra sua bunda como se quisessem arrancar-lhe os couros, extraia-lhe
soluços e provocava-lhe uma tremedeira incontrolável nas pernas. Na manhã seguinte,
sua ida para o trabalho foi como se o tal sonho da noite anterior tivesse se
repetido, pois o ônibus não apenas estava lotado de homens, como cada um deles
parecia ter resolvido tirar dela uma lasquinha!
Um turbilhão
de desejos e sensações confusas tomou de assalto os pensamentos da pobre viuvinha
que se sentiu diferente naquela memorável semana, como se tivesse libertado de
alguma coisa que guardava secretamente em seu interior. Mas para sua satisfação,
o seu carro ficou pronto no dia combinado e o mecânico ainda lhe fez a
gentileza de ir deixá-lo em sua casa pela noite. Seu sofrimento havia chegado
ao fim.
Na manhã
seguinte, tomou um bando demorado com sais e óleos para sentir a pele macia e depois
perfumou-se com alfazema francesa. Vestiu-se cuidadosamente admirando-se no
espelho, escolheu a lingerie mais transparente e delicada para, em seguida, mudar
de ideia resolvendo que dispensaria o uso daquele artigo obsoleto. Sentiu-se
linda, com uma beleza quase imoral, e quando finalmente ficou pronta para ir
para o trabalho, foi lépida e fagueira para o ponto do ônibus!
Rio
Vermelho, 3 de agosto de 2012.
Um comentário:
Querido!!!!
Será que vocé pensou um pouquinho em mim escrevendo esta linda stória?
Eu adorei-a. Infelizmente os Austiacos nao sao atrevidos como os
Brasileiros
e mesmo eu resolvendo tomar o onibus todos os dias nao teria este
efeito.
Mas quem sabe, eu acho um "onibus austríaco", onde estes sinais de vida
acontecem!
Beijos para vocé meu amigo!
Karolina
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