Sob os resquícios da desbotada luz alaranjada que
banhava o mirante da Paciência, a moça, solitária, sentada encolhida num banco
de madeira em frente à imensidão de mar, olhava indiferente para a magnífica
paisagem no horizonte, no entanto, sem conter a profusão de lágrimas que escorriam
borrando a sua maquiagem. Numa mão, ela segurava um smartphone com o qual trocava
mensagens de uma longa e dolorosa conversa. A cada nova mensagem recebida, ela
se desfazia em mais choro e soluços. Seus polegares trabalhavam ágeis e rápidos,
e suas mensagens eram respondidas na mesma prontidão, como se ela e o seu
interlocutor estivessem envolvidos num frenético videogame.
Ela lia as mensagens movendo os lábios, sussurrando
cada palavra para melhor assimila-las. Em seguida, soltava um gemido e levava a
mão até a boca, que se retorcia e ficava feia como a de uma velha, para sufocar
o choro. A sua expressão de sofrimento contrastava com aquela magnífica tarde
de final de verão. Em sinal de respeito, ou talvez por pura indiferença, as
poucas pessoas que desfrutavam da tranquilidade daquele local e de sua vista
panorâmica, fingiam que não percebiam nada.
Depois de quase uma hora naquele suplicio, por fim, as
limitações da própria tecnologia deram um basta àquela discussão, quando o aparelho
da moça ficou mudo, graças ao esgotamento de sua bateria. Ela ainda teve o
ímpeto de agitá-lo, assim como fazem as pessoas com um frasco de ketchup, na vã tentativa de aproveitarem
até a sua última gota.
Ela resignou-se com a interrupção e olhou
desesperançada para o oceano à sua frente, já indefinido pelo começo de escuridão.
Naquele momento, um imenso transatlântico cruzava solitário a linha do
horizonte, pontilhado de luzes cintilantes. Ela o observou com uma expressão
triste e desejou estar a bordo, fugindo daquela angústia em seu coração. Faria
qualquer coisa para voltar no tempo, para jamais ter se envolvido com aquele a
quem amava e a fazia sofrer. Palavras duras foram ditas, verdades expostas,
acusações foram trocadas numa onda sem fim de ressentimento. O relacionamento,
em fim, tinha se acabado. Ela parecia ter envelhecido.
Dois dias depois, a mesma jovem reapareceu no mirante.
Parecia que tinha mudado, apagado de suas lembranças aquele triste final de
tarde. Havia um brilho em seus olhos e sua expressão era serena, parecia mais
jovem. A maquiagem no rosto estava impecável. Desta vez, até contemplou o pôr
do sol com uma expressão de admiração e contentamento, sentiu prazer em
respirar aquele ar impregnado pelo cheiro de maresia e algas marinhas. Minutos
depois, ela percebeu a aproximação de um vulto pelo canto do olho. E ao olhar
para o lado, deu um sorriso aberto e levantou-se do banco para ir se aninhar
nos braços estendidos do homem alto e forte que se aproximava. Se houve
lágrimas, desta vez foram de felicidade.
Rio Vermelho, 23 de março de 2017.
3 comentários:
A melhor parte da restauração da orla marítima deve ter sido a criação daquele mirante! Antes, só existia a Pedra dos Pássaros, sem pássaros, porque não chegam mais barcos arrastando o cheiro de peixes e as gaivotas sumiram e não vão mais repousar sobre a pedra que antes era somente delas . Quando os barcos começarem a voltar , elas estarão de volta e a pedra será novamente delas . Enquanto isso, o mirante bem em frente a tal pedra, servirá para as pessoas relaxarem com a linda paisagem, ver os navios no horizonte significando que tem gente chegando ou indo, ou enamorados trocando mensagens através de celulares , o que propicia a pessoas como você , observar e se inspirar para escrever um conto de amor virtual com filnal feliz. Ali no mirante você vê coisas...
Cristiano, ate que em fim , um conto seu, teve um final feliz.
Um abraço, Paulo.
Gostei a linguagem está fluídica tornando a leitura agradável não caiu na maninha de brasileiro de explicar demais a cena.
Boa sorte e
muita inspiração
Márcio Rodriguez
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