O maior desejo de Lindiane era um dia se casar e formar uma bela família, assim como fizera os seus queridos e amados pais. E para realizar este maravilhoso sonho, ela contava ter ao seu lado Dinho, seu futuro e amado esposo, depois de quase seis longos anos de noivado. Isto sem levar em conta os outros três de namoro na porta, sob os olhares severos e disfarçados do pai. Para ela, não havia bem mais valioso e sagrado que uma família. Casar e ter filhos poderia parecer, para muitas mulheres modernas, uma coisa antiquada, apesar de que, invariavelmente, era o que lhes acontecia mais cedo ou mais tarde, a menos que escolhessem por levar uma vida fora dos esquemas convencionais ou ignorar os chamados da natureza para trazer a este mundo mais um habitante.
Lindiane já tinha tudo planejado nos mínimos detalhes, desde o momento em que passou a ter aquele irremediável desejo de formar sua própria família, quando ainda era apenas uma adolescente. Já tinha escolhido o modelo de vestido de noiva, seria igualzinho ao da mãe. Só não seria o próprio porque este não lhe cabia no corpo mais robusto, e qualquer ajuste que sofresse o tornaria definitivamente diferente do original. Era melhor fazer outro com suas medidas. Seria todo em tafetá, e como a tradição mandava, branco, com acabamento nas bordas e no decote em rendas de bilros trazidas do Ceará. Sua tia Arlinda, se encarregaria de sua confecção, uma vez que não havia em toda a cidade, melhor costureira de vestidos de noiva que ela. A cerimônia aconteceria na capela do Colégio Santo Inácio, onde estudara desde menina e onde rezara pela primeira vez pedindo a Deus um marido bom e justo.
Dinho era tudo que se poderia esperar de um futuro marido e bom pai. Ele era um homem alegre e muito trabalhador. Atencioso e carinhoso com ela, e atento a satisfazer-lhe os desejos nos mínimos detalhes. Ele era compreensível e descontraído. Gostava de crianças. Seus pais, também, gostavam muito dele. Ela também gostava muito da família dele que era composta apenas da mãe viúva e de uma irmã com que ela se relacionava muito bem. Enfim, tudo se coadunava para abençoar aquela união como algo sagrado e eterno.
Desde o seu primeiro emprego, Lindiane teve o cuidado de economizar uma pequena porção de seu salário para comprar o seu enxoval de casamento, e como planejara se casar num prazo de no máximo oito anos, até lá já teria o suficiente e ainda sobraria alguma coisa a mais para dar entrada num pequeno apartamento. Seu sonho era comprar um na mesma rua onde moravam os pais, assim poderia contar com a ajuda da mãe para cuidar das crianças quando os filhos nascessem e ela tivesse de voltar a trabalhar. Gostaria de ter um casal. O menino se chamaria Aurélio, em homenagem ao falecido pai de Dinho. Já a menina seria Arlete, o nome de sua querida avó materna. Na hipótese de nascerem dois meninos ou duas meninas, pelo menos um deles receberia um daqueles nomes sagrados e Dinho escolheria o outro.
Lindiane ficava imaginando como seria a decoração de seu lar. Os móveis da sala de visitas seriam novos e bonitos, nada muito expendioso, mas de bom gosto. Colocaria um carpete branco e macio e um conjunto de sofá com poltronas igualmente macios. A mesa da sala seria redonda toda de madeira. Ao centro, ficaria o vazo de cristal Fratelli Vita que ela tanto gostava e que fora uma herança de sua avó. Em dias especiais, o encheria com flores do campo de cores variadas que perfumariam toda a casa com uma fragrância agradável e suave. Sobre a mesa quadrada de fórmica da cozinha, colocaria uma gamela onde poria, semanalmente, frutas frescas de todos os tipos de acordo com a estação. Ela adorava o colorido saudável das frutas. Já ouvira falar que era moda fazer aquela decoração usando-se legumes e verduras também, e por isto, estava curiosa em experimentar aquela novidade. O quarto do menino seria pintado de azul bem claro e decorado com brinquedos e pôsteres de carros e aviões. O da menina seria num tom de rosinha com gravuras de flores penduradas nas paredes e bonecas de pano sobre a cama e prateleiras. Seu quarto, apesar de ser o maior de todos, seria o mais simples. Apenas a cama de casal, um armário para colocar roupas e uma penteadeira. Queria que o exemplo de uma vida bem regrada servisse de modelo para as duas crianças. A casa toda seria limpa diariamente e uma vez por semana passaria óleo de peroba sobre os móveis para dar aquele cheirinho de limpeza.
Foi este sonho que permeou a sua imaginação durante muitos anos até marcar a data do casamento com Dinho para dali a um ano, quando ele completaria exatos trinta anos. Os dois até já tinham marcado o dia que dariam a entrada no novo apartamento, em duas semanas. Seu sonho já estava se tornando uma realidade. A vida tinha o sabor doce, pensou certa manhã Lindiane.
Um belo dia antes da data que Lindiane e Dinho haviam combinado para irem à imobiliária fechar o negócio do apartamento, Dinho parecia mais agitado do que o de costume. Quanto ele estava assim naquele estado, Lindiane já sabia que ele queria lhe dizer alguma coisa importante e não sabia como.
— O que você está tentando me dizer, Dinho? Por que você está desse jeito? — perguntou preocupada.
— Sabe, Nane, estive com meu tio hoje esta tarde. Agente conversou bastante, sabe. — disse sem jeito.
— É mesmo? E sobre o que conversaram? — perguntou curiosa.
— E se agente pegasse todo esse dinheiro do casamento que agente vem juntando e investisse tudo numa plantação de coco-anão? O que você acha? — perguntou desconcertado evitando olhá-la nos olhos.
Ao ouvir aquele plano esdrúxulo, as lágrimas começaram a verter dos olhos de Lindiane feito um coração que sangrava partido. Ela, que esperara tanto para se casar com Dinho e realizar seu sonho de menina, estava, então, diante de um homem que ela desconhecia. Aquela sugestão infame era o modo de Dinho declarar que não queria mais casar. Que mulher esperaria por algo tão incerto por mais cinco anos, o tempo necessário para um pé de coco-anão crescer e começar a dar os primeiros frutos? Quantos cocos seriam necessários para realizar o seu sonho de casamento? Como vocês podem ver, este não é nenhum conto de fadas.
Rio Vermelho, 18 de dezembro de 2009.