segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Alma Gêmea Demais

Era tão louco por Aldalice a ponto de desejar devorar a sua carne até os ossos. Nunca se viu tamanha paixão. Chegava a ser quase uma obsessão. As amigas da moça morriam de inveja. Nossa, como eu queria ter um homem tão apaixonado por mim assim, suspiravam.
De fato, Heitor era um namorado como não se via igual. Fazia de tudo para surpreender a sua amada. Fazia-lhe as vontades, enchia-lhe de mimos. Certo dia, ao passar em frente à loja, viu na vitrine um frasco de Gordius Choice, o perfume preferido de Aldalice. Raríssimo de se encontrar. Não teve dúvida. Entrou e comprou o único frasco restante. Nem pestanejou ao pagar uma grana por ele.
À noite, aprontou-se todo e foi fazer uma surpresa à namorada. Ela o recebeu em casa como de costume. E como não disse nada, ele puxou assunto. Não está sentindo um cheiro familiar? Deu um sorriso meio sínico. Sim, você está usando um perfume parecido com o meu! Ao invés de presenteá-lo à Aldalice, Heitor preferiu usá-lo. E foi assim que tudo começou.
Certa noite, depois de fazerem amor, ele teve uma ideia divertida. Vestiu as roupas de baixo de Aldalice e aí fez uma imitação dela. Ficou tão parecida que os dois caíram na gargalhada. Depois voltaram a se amar. A brincadeira teve o efeito de um afrodisíaco em Heitor, Aldalice sentiu a sua pujança vitaminada.
Aquela brincadeira mexeu com Heitor. Ele gostou de sentir a macies do lingerie da namorada roçando a sua pele máscula. Porque não usavam o mesmo material para confeccionar cuecas, ele se perguntou. O rapaz sentiu uma comichão gostosa dentro daquelas delicadas peças íntimas. Era uma sensação indescritivelmente agradável usar calcinha e sutiã.
Uma noite, ele veio da casa de Aldalice com alguma coisa escondida no bolso da calça. Trancou-se no quarto e despiu-se. Vestiu uma calcinha e um sutiã roubados da namorada. Foi dormir daquele jeito. Na manhã seguinte, acordou sentindo-se estranhamente diferente. Alguma coisa tinha mudado.
Não satisfeito em usar apenas a calcinha e o sutiã da namorada, certa vez, ele trouxe para casa um de seus vestidos prediletos escondido em uma sacola de compras. Trancou-se logo no quarto para prova-lo diante do espelho. Caiu feito uma luva. Não é que Aldalice e Heitor vestiam o mesmo manequim!
Deixa de esquisitice, disse Aldalice quando Heitor mostrou-lhe a novidade. Estava usando o seu vestido e de quebra a calcinha e o sutiã. Onde já se viu um macho como você se vestir de mulher. Não é carnaval, meu filho, tire já esta fantasia, ela ordenou incomodada com o que acabara de presenciar.
Mas as esquisitices de Heitor não pararam por ali. Um dia ele foi encontrar a namorada para o almoço. Ela o esperava no restaurante combinado e quando o viu chegar, quase teve um chilique. Heitor chegou vestindo uma saia e uma blusa muito parecidas com as que ela usava para aquele encontro. Ele também usava bijuterias como ela, sapatos altos e uma Louis Vuitton paraguaia igualzinha à dela. Não deixou de passar o batom da mesma cor que Aldalice usava e uma leve maquiagem como a dela. Para completar, ele pôs uma peruca da mesma cor que o seu cabelo e com o corte semelhante.
Aquilo já tinha ido longe demais. Heitor tinha passado dos limites. Aldalice passou-lhe uma descompostura ali mesmo em público. E foi-se embora o proibindo de procura-la novamente. Não até que ele pusesse fim àquela maluquice. Onde já se viu namorar com ela mesma!

Rio vermelho, 6 de outubro de 2014.

2 comentários:

Anônimo disse...

incrivel esta sua criatividade.

abs

Anônimo disse...

Ele mudou de lado!
Lulu Mano