Era
o tipo de homem desejado pela maioria das mulheres. E a maioria das mulheres
era o tipo desejado por ele, cuja disposição para conquistá-las era quase uma
obsessão. Entretanto, elas não lhe passavam
de simples diversão e de uma forma de satisfação de seu próprio ego. Seduzia
uma após outra com a mesma facilidade com que se colhem frutas no pomar, que depois
de chupadas, descarta-se o bagaço.
João dos Prazeres tomou o nome de
batismo como um estilo de vida. João, o mais elementar dos nomes, de fácil assimilação
e aceitação, muito popular. Prazer(es), um bem supremo ao qual dedicava a vida à
sua satisfação pessoal. Era como se sua existência tivesse na diversão o seu
único propósito, e se divertir, em seu limitado vocabulário, significava seduzir
belas mulheres, todas elas, se possível. Não havia noite em que ele não pusesse
os pés fora de casa para “se divertir”, era como ele se referia à sua prática conquistadora.
Suas táticas de sedução eram conhecidas
de qualquer conquistador barato, e de muitas desafortunadas mulheres, infelizmente.
Depois de aproximar-se da vítima escolhida, ele a envolvia com uma manjada conversa
fiada, os mesmos elogios fáceis à sua beleza e ao seu sorriso. Não há coração
feminino que não se renda à lisonja de um homem atraente e conquistador e, por
tanto, não demorava muito até que ela, imprudentemente, cedesse ao seu encanto,
tornando-se mais uma em sua longa e bem sucedida lista.
No decorrer da noite, então, ele não se
dava por satisfeito enquanto não desfrutasse dos favores da moça, porque ele
era muito insistente neste aspecto, e usava de todas as suas artimanhas para
alcançar este que era o seu objetivo principal. A noitada, então, tornava-se num
jogo sensual de lobo perseguindo a lebre, até que esta se desse por vencida e
capitulasse. Entretanto, não havia dúvidas de que fosse exatamente este o plano
dela, também, desde o início, apesar de ela seguir fielmente os conselhos de
sua querida mãe, que julgava ser o mais apropriado para uma moça de família resistir
às investidas do homem, nem que fosse só um pouquinho, para que ele não tivesse
uma ideia errada a seu respeito.
João dos Prazeres surpreendia as
mulheres como amante, pois não apenas ele era muito habilidoso no assunto, como
as deixava apaixonadas. Entretanto, ele considerava tedioso sair com a mesma
mulher mais de uma vez, se enjoava dela com a mesma rapidez com que se
interessava. Depois da noitada, ele simplesmente sumia do mapa, não atendia os insistentes
telefonemas da moça, ignorava-a e ponto final. Como era de se presumir, ela sofria
por ser abandonada, mergulhando num mar de mágoa, amargura e arrependimento.
Será que, agindo assim, ele realmente gostava das mulheres, ou apenas as punia
por serem mulheres?
Entretanto, certa vez o destino lhe
pregou uma peça, confrontando-o com a sua dura realidade, fazendo com que sua
máscara caísse, revelando a si mesmo o seu verdadeiro ser. João dos Prazeres chegou
ao mesmo bar o qual dava início as suas noitadas e ocupou o seu lugar favorito
ao balcão. Ao seu lado, logo em seguida sentou-se José, um desconhecido, que o
saldou com um brinde de cerveja. Aquele gesto amigável foi o suficiente para
que os dois estranhos se pusessem a conversar como velhos amigos, pois não há
nada como uma garrafa de cerveja e dois copos para celebrar a amizade entre
dois homens que acabaram de se conhecer. José estava naquele bar pela primeira
vez e tinha o mesmo propósito de João, conquistar uma mulher para se divertir. E
não demorou muito para o álcool fazê-lo soltar a língua, contando a João
inconfidências sobre a sua mais recente aventura amorosa. João ficou fascinando
ao ouvir aquele relato, parecia ele mesmo agindo em uma de suas conquistas. Pediram
mais uma cerveja e brindaram às mulheres, mas, desta vez, foi João quem contou
ao novo amigo uma de suas aventuras. E assim os dois companheiros de divertiram
preenchendo o vazio da noite com cervejas e histórias picantes.
A noite se passou sem João, entretanto,
ter posto os olhos em uma única mulher se quer e, certamente, havia muitas delas
para serem admiradas naquele lugar. No entanto, sua atenção foi arrebatada por
aquele rapaz com quem acabara de fazer camaradagem, como se ele possuísse um
magnetismo que João não pudesse resistir. João sentia-se estranhamente naquela situação,
um desejo forte e inexplicável de atração por um homem que ele jamais experimentara
algo semelhante antes em toda a sua vida. Ao ouvir José contar com prazer e
riqueza de detalhes as suas aventuras sexuais, era como se ele estivesse
ouvindo a si mesmo ou admirando-se ao espelho. Os dois homens riram juntos do
modo como ambos se divertiam com as mulheres e depois as desprezavam feito algo
sem mais utilidade.
Na despedida, ao final da noite, um
aperto firme de mão selou de vez a nova amizade, seguido de um forte e longo
abraço que João deu em José, fazendo este se sentir incomodado. E, sem
conseguir conter o impulso, João tentou beijar os lábios de José, ao que foi
repelido por este com firmeza e repulsa. João, também, chocou-se, entretanto, consigo
mesmo, porque aquele gesto foi impróprio de sua natureza, inédito de sua pessoa.
Atordoado com o que acabara de acontecer, ele deixou o bar envergonhado, logo em
seguida. No caminho para casa, João recriminava-se e, ao mesmo tempo, não conseguia
fazer desaparecer José de seus mais íntimos pensamentos e fantasias. Desejos
conflituosos lhe afluíam à cabeça como uma tempestade, confundindo-lhe os
sentimentos. Para seu assombro, ele se descobriu desejando estar com aquele
homem a noite inteira, ouvir mais uma vez a sua grave voz, sentir a rigidez de
seu corpo, tão diferente da maciez feminina, e beijá-lo a noite inteira. João,
então, desmoronou chocado com aquela descoberta a seu próprio respeito,
sentiu-se no inferno. Deu meia volta e retornou ao bar onde estava antes, aproximou-se
de José, que continuava ao balcão, e o atacou de assalto com os punhos cerrados
e chutes enquanto gritava tomado de cólera “eu sou é macho!, eu sou é macho!,
eu sou é macho!”
Rio Vermelho, 9 de outubro de 2012.