terça-feira, 17 de setembro de 2013

Velhice ou Velhaco Precoce?

À medida que os anos passam, eu vou me tornando um sujeito mais cínico. Não sei ao certo se isto é decorrente de um processo natural do envelhecimento ou se, de fato, estou ficando mais cínico, mesmo. Outro dia, enquanto eu aguardava a minha vez na longa fila do banco, a atendente me chamou, achando que eu fosse uma pessoa idosa e, por isso, tinha prioridade no atendimento. Já era a terceira vez que algo semelhante me acontecia, e, diferente das ouras vezes em que eu desfiz o engano, olhei desanimado para a longa fila à minha frente e depois lancei um olhar de candura para a moça do caixa me dirigindo em sua direção com os passos lentos de um idoso. Acho que até tossi um pouco para demonstrar que aquela poderia ser a minha ultima fila.
Ainda que falte muito tempo até que eu goze de tais privilégios, eu não me ofendo se me tomam por um sexagenário, embora, minha aparência não esteja tão ruim assim. Quando eu faço a barba, corto os cabelos e tomo um bom banho, fico novo em folha! A verdade é que eu detesto aguardar em filas – e quem gosta? – e se me tomam por tão velho a ponto de merecer um lugar antes de todos, eu me vingo! Entretanto, não ajo como outros que estacionam em vagas para idosos ou deficientes físicos. Minha birra é só com as filas quilométricas de banco no início do mês e da lotérica em dia de jogo acumulado. Eu fico me perguntando, porque será que idoso tem prioridade para jogar?
Dia desses, eu aguardava o sinal para atravessar uma movimentada rua aqui no Rio Vermelho. Era um daqueles horários da manhã que aparecem automóveis de tudo quanto é lado. Enquanto eu esperava pacientemente pelo sinal verde para pedestre, notei que ao meu lado também esperava uma bela moça. Depois que uma faculdade particular para filho de gente rica se instalou aqui no bairro, não apenas os congestionamentos por aqui aumentaram, as contramãos em vias de mão única também e as calçadas se tornaram estacionamentos para os automóveis dessa gente bonita e civilizada, mas um grande número de moças bonitas começou a circular pelo bairro durante o dia, equilibrando-se desajeitadas sobre finos e longos saltos altos. Uma dessas beldades ao ser questionada por mim, depois de colocar os quatro pneus de seu lindo carrinho sobre o passeio de uma rua movimentada, respondeu-me que estava no seu direito, uma vez que não havia placas no local proibindo-a de fazer aquilo!
Voltando à moça ao meu lado no semáforo (é assim que o baiano chama o sinal luminoso de tráfego). Eu sorri para ela encantando e ela me devolveu o sorriso com a mesma simpatia. Para a minha satisfação, ela até chegou mais próximo de mim. Foi quando o sinal abriu para nós e ela num movimento rápido surpreendeu-me segurando o meu braço na altura do cotovelo dizendo: “Vamos?” Ao que eu perguntei chocado: “Para onde?” Ela responde: “Atravessar a rua, o senhor não estava querendo uma ajuda para atravessar?” Por mais esta eu não esperava, mesmo!

Rio Vermelho, 17 de setembro de 2013.

terça-feira, 3 de setembro de 2013

A Luta Para Nascer ou Pelo Renascimento do Parto Natural

Outro dia eu estava empenhado na simplória tarefa de comprar um papeiro. Caso alguns desconheçam este útil artefato de cozinha, informo-lhes que se trata de uma pequena panela de metal, muitas vezes com o acabamento feito de ágata, usada para fazer mingau para o bebê. Eu o uso para ferver um ovo, por exemplo, fazer molhos e, é claro, fazer mingau de aveia, minha refeição preferida no café da manhã. Aquele que me serviu por tantos anos, de tão velhinho que estava, o cabo desprendeu-se da panela. Sem conserto, foi aposentado com honrarias, por relevantes serviços prestados (joguei no deposito).
         Percorri três grandes shoppings da cidade e neles entrei em lojas especializadas em artigos para bebês, em lojas de variedades para a casa e em lojas de artigos para a culinária. Em nenhuma delas encontrei um único papeiro. A procura por um substituto ao que eu tinha me levou ao conhecimento de uma triste realidade de nossos tempos. As mães de hoje não fazem mingaus para os seus bebês, dá muito trabalho. Preferem comprar um produto industrializado que vem numa lata bonita. É só misturá-lo ao leite morno e voilá! Será que esta maravilha moderna é realmente saudável ao desenvolvimento do rebento? Foi sepultado de vez o romantismo de fazer com amor o mingau da criança, mexendo-o com a colher de pau em frente do fogão, como fizeram muitas mães de minha geração. As jovens mamães de hoje em dia tem mais o que fazer.
         Mães modernas desejam praticidade e não ter tanto trabalho. Até o trabalho de parto tem rejeitado. Somos o país do mundo campeão em cesariana. É tão conveniente marcar o dia e hora em que vai se dar a luz, nada da nojeira da bolsa rebentando e sujando o assoalho limpo, nada de correr para o hospital sentindo dores e contrações no meio da madrugada, no fim de semana. Nem sentir as dores lancinantes provocadas pela criança procurando o caminho de entrada neste mundo insano. Para o médico é, também, um alívio não ter a inconveniência de um parto no meio de seu fim de semana à noite, interrompendo o seu merecido descanso na casa de praia. Faz bem à sua conta bancária.
         É triste, mas é uma dura realidade, jovens mães abdicaram do direito ao parto natural.  Algumas por vontade própria e conscientemente, outras por indução daqueles que elas escolheram para cuidar de seu bem estar, que um parto cesariano é mais lucrativo financeiramente. Precisa falar mais? Jovens mães, não renunciem de uma experiência que é só da mulher e que só trás benefício ao seu bebê. Sabiam que enquanto o bebê está na barriga da mãe ele está num ambiente “esterilizado” e ao sair para mundo, por vias naturais, este é batizado ao longo do caminho com um coquetel de “germes” que ajudam o seu sistema imunológico a enfrentar a barra aqui fora?
         O nascer por via do parto natural é um grande esforço para a mãe e é, também, a celebração de sua experiência de gestação plena e bem sucedida, um fato único em sua vida, um ritual de passagem para se tornar mãe. Ela conseguiu, foi até o fim! Não passar por esta última parte é como ler um livro e abdicar do capítulo final, não viverá a emoção do final da estória. Algo vai sempre estar faltando... Nascer pelo parto natural é, também, a primeira grande luta do bebê para chegar ao mundo. Outras lutas virão mais adiante, mas se ele conseguir enfrentar pelo menos esta, ele terá a garra para as outras que surgirão pela frente. E se, ao contrário, ele for poupado desta primeira luta, como será a sua existência frente às muitas dificuldades que ainda surgirão pela frente?

         Rio Vermelho, 3 de setembro de 2013.