quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

A Chapada é inesquecível, mas o nome de uma certa moradora, nem tanto.

Acabo de voltar da Chapada onde afoguei o calor miserável do dia em mergulhos nos caldeirões do Serrano cujas águas ferruginosas fazem ranger os dentes sob o sol a pino em pleno verão, uma delícia. E respirei natureza, muita natureza bebendo dela o seu sumo que me inspirou a elaborar o final de meu livro que “salvei” em minha cachola, só precisando convertê-lo em bytes no computador. E à noite dormi com o balanço da rede armada na varanda sentindo o sereno da floresta sob o brilho das estrelas que lá parecem brilhar com mais vida e generosidade. Trouxe de suvenir na bagagem apenas uma intermitente tosse de cachorro e uma infecção intestinal de me dar calafrios, e que ainda me farão, por alguns dias, recordar com saudades daquela semana de perfeita comunhão com a natureza.

Na Chapada, o ritmo de vida obedece às suas próprias convenções, que é a de não haver pressa alguma e aproveitar o momento. Por exemplo, no restaurante o garçom demora a aparecer para pegar o pedido, que demora a chegar à mesa e ao final come-se lentamente. E foi na hora do almoço que desci até a cidade à procura de um restaurante que oferecesse um tempero diferente. Subia a Rua das Pedras quando encontrei uma querida amiga de muitos anos que sempre me convida para ir a sua casa, no final da tarde, tomar um café com bolo de aipim que ela fará especialmente para mim, mas que ao chegar lá, o maridão já o devorou até as últimas migalhas. Mas o que me leva à sua casa mesmo é a prosa agradável, contento-me com a xícara do café colhido em seu quintal e com as fofocas e “causos” da cidade. Deu-me um abraço afetuoso e eu perguntei pela família. Enquanto nos queixávamos do calor cujo assunto é o favorito nas conversas de rua, superando as seguidas prisões do prefeito da cidade por improbidade administrativa, minha atenção foi distraída pela passagem de uma bela moça de corpo forte e saudável, dessas que se dizem que podem dar muitos filhos, usava um short de chita apertado que denunciava a redondeza das nadegas apoiada em dois pares de pernas grossas formidáveis. A moça devia fazer muitas trilhas pelo mato, pois tudo nela era músculo e saúde sem, no entanto, aparentar ser algum tipo de atleta. O cabelo preto era crespo e cheio amarrado para trás num coque. Minha amiga percebeu minha curiosidade e foi logo informando “ela está solteira há três meses”, ao que eu lhe perguntei “E cuma é o nome dela?” E foi neste momento que precisei pedir-lhe que me repetisse mais uma vez o nome da criatura, pois eu nunca ouvira nada semelhante antes nem aqui e nem em outro mundo.

Na Chapada encontra-se de todos os estilos de mulheres, desde a perua à bicho-grilo. E parece que o local também tem a propriedade de atrair pessoas cujos nomes são exóticos como se fosse próprio daquele fim-de-mundo acolher pessoas de nomes esdrúxulos. São combinações de nomes de astros com elementos da natureza ou nomes de alguma divindade indiana ou um vocabulário indígena. A alcunha daquela bela moça não se parecia com nada que eu já ouvira antes e cuja sonoridade tanto lembrava nome de personagem de revistinha em quadrinhos japonesa como nome de pomada milagrosa para combater fungo entre os dedos. Eu desisti de lhe pedir que repetisse mais uma vez o nome, pois a minha capacidade de memorizá-lo parecia limitada.

Minha amiga chamou pela moça que deu meia volta e veio sorridente ao nosso encontro e se apresentou com aquele nome incomum que não consigo fixar na memória. E logo fiquei sabendo que ela era a feliz proprietária de um restaurante ali perto, mas que naquele dia da semana, que não era feriado, não iria abrir as portas para o almoço porque ela achava que andava trabalhando muito ultimamente e isto estava afetando-lhe a sua qualidade de vida pois o que mais ela almejava era não ser escrava do trabalho e que felizmente a cidade dispunha de outros restaurante de modo que ninguém passaria fome por sua causa. Eu, por meu turno, pensei lá com os meus botões se a sua comida seria tão apetitosa quanto a sua pessoa. De qualquer forma, eu continuava sem lembrar seu nome e achei isto estranho de minha parte, pois tenho grande facilidade de lembrar nome de mulher bonita, mesmo aquelas que eu nunca tenha sido apresentado.

Terminei indo comer no mesmo lugar de sempre que é onde metade da população de Lençóis frequenta, inclusive a delegada e os forasteiros como eu, que é o Bode Grill, onde o cardápio oferece iguarias de dar água na boca como o ensopado de casca de jaca e a salada de palma, que é um tipo cacto da região muito usado para engorda do gado. No entanto, fui outras vezes até a porta do restaurante daquela bonita moça cujo nome me falha a lembrança e me pareceu que não havia um acordo entre o seu horário de funcionamento e a minha fome pois, sempre que eu aparecia ou este ainda não tinha aberto ou já tinha fechado, mas foi graças a isto que conheci outros estabelecimento de Lençóis os quais eu jamais havia posto os pés antes e a isto os concorrentes lhe são muito gratos.

Mas o mais incrível desta estória toda é que até a hora de fechar esta crônica eu não consiga me recordar o nome bizarro daquela moça, mas com certeza ela não se chamava Rumpelstiltskin.

Rio Vermelho, 17 de janeiro de 2012.

4 comentários:

Sarnelli disse...

Excelente, Cristiano. Enrolou até o fim e não disse o nome da moça !

Greciane disse...

Olá,

Gosto da forma maliciosa, divertida e agradável como escreves. Volta e meia faço-te uma visitinha, sempre silenciosa (não sou de ficar comentando tudo que leio, apesar dos blogueiros ensandecidos por seguidores adorarem... enfim!). Hoje me peguei com vontade, seu texto me fez relembar alguns bons momentos e outros nem tanto nesta cidade (não gosto muito de visitar cidades onde tem mais forasteiros do que nativos). Deve ser porque sempre acho que qualquer visita é uma grande laboratório e o meu olhar “infectado” da antropologia não me permite olhar com outros olhos...
Já me alonguei demais. Finalizo fazendo uma pequena observação: a "pegada" do texto é muito interessante...

Obs: Sugiro que faças uma visita à Serra das Paridas na sua próxima visita à cidade. É um Sítio Arqueológico com pinturas rupestres muito interessante.
Um abraço e até a próxima visita.

arqueologiaeimagem.blogspot.com
Greciane Neres

docerachel disse...

Não importa mais o nome da donzela. O que carece de importância real, é dizer que a cronica é adorável.

Anônimo disse...

Entrei no blog e adorei, muito gostoso e fácil de se envolver e querer ler mais um pouquinho.
Cíntia Fasano